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Bem vindo a este espaço de divulgação dos sabores e da gastronomia que cá se faz. Sem falsos purismos ou fundamentalismos, sempre na perspectiva da pessoa humana e do equilíbrio delicado entre o saber fazer, o "sabe" e o "faz". Sabe "bem", mas o que é que "faz" ao meu corpo?
Um belo de um cozido à portuguesa, que bem que me sabe. E que tal umas refeições mais ligeiras para criar espaço para aquela sobremesa especial ou para aquele dia imperdível? Levamos até si o saber fazer e o que de melhor se cozinha por estes lados e também o que melhor vai fazer ao seu corpo.
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quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Ode ao Pão


Ode ao Pão

Poema de Pablo Neruda (trad. Fernando Assis Pacheco)

Recitado por Mário Viegas (in "Pretextos Para Dizer", 1978; reed. Público, 2006)


Pão,

com farinha

água

e fogo

te levantas.

Espesso e leve,

reclinado e redondo,

repetes

o ventre

da mãe,

equinocial

germinação

terrestre.

Pão,

que fácil

e que profundo tu és:

no tabuleiro branco

da padaria

estendem-se as tuas filas

como utensílios, pratos

ou papéis,

e de súbito a onda

da vida,

a conjunção do germe

e do fogo,

cresces, cresces

de súbito

como

cintura, boca, seios,

colinas da terra,

vidas,

sobre o calor, inunda-te

a plenitude, o vento

da fecundidade,

e então

imobiliza-se a tua cor de oiro,

e quando já estão prenhes

os teus pequenos ventres

a cicatriz escura

deixou sinal de fogo

em todo o teu doirado

sistema de hemisférios.

Agora,

intacto,

és

acção de homem,

milagre repetido,

vontade da vida.

Ó pão de cada boca

não

te imploraremos,

nós, os homens,

não somos

mendigos

de vagos deuses

ou de anjos obscuros:

do mar e da terra

faremos pão,

plantaremos de trigo

a terra e os planetas,

o pão de cada boca

de cada homem,

em cada dia

chegará porque fomos

semeá-lo

e fazê-lo,

não para um homem, mas

para todos,

o pão, o pão

para todos os povos

e com ele o que possui

forma e sabor de pão

repartiremos:

a terra,

a beleza,

o amor,

tudo isso

tem sabor de pão,

forma de pão,

germinação de farinha,

tudo

nasceu para ser compartilhado,

para ser entregue,

para se multiplicar.

Por isso, Pão,

se foges

da casa do homem,

se te escondem,

se te negam,

se o avarento

te prostitui,

se o rico

te armazena,

se o trigo

não procura sulco e terra,

pão,

não rezaremos

pão,

não mendigaremos,

lutaremos por ti com outros homens,

com todos os famintos,

por todos os rios, pelo ar

iremos procurar-te,

a terra toda repartiremos

para que tu germines,

e connosco

avançará a terra:

a água, o fogo, o homem

lutarão junto a nós.

Iremos coroados

de espigas,

conquistando

terra e pão para todos,

e então

também a vida

terá forma de pão,

será simples e profunda,

inumerável e pura.

Todos os seres

terão direito

à terra e à vida,

e assim será o pão de amanhã,

o pão de cada boca,

sagrado,

consagrado,

porque será o produto

da mais longa e dura

luta humana.

Não tem asas

a vitória terrestre:

tem pão sobre os seus ombros,

e voa corajosa

libertando a terra

como uma padeira

levada pelo vento.


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